segunda-feira, 29 de maio de 2023

ACORRA A MATA ATLÂNTICA! Por Antonio Mendes Guimarães

ACORRA A MATA ATLÂNTICA!

Considerada pela UNESCO como "Reserva da Biosfera da Mata Atlântica", os remanescentes dessa floresta, que é uma das três maiores prioridades do Planeta (hotspot), no Sul da Bahia, contribuíram com a composição deste singelo e fidedigno texto em homenagem aos meus pais e aos meus avós paternos, agricultores no município de Ilhéus-BA e Guaratinga-BA.
Com a experiência herdada dos meus avós e com o ouro que ainda reluzia em seus dentes, meu pai se incumbiu de revitalizar certa propriedade rural de maneira memorável. Com respeito à equipe, contribuindo com a preservação da Mata e a economia das "Terras do Sem-Fim", cultivando um fruto (ouro negro), cujas suas amêndoas já serviram de moeda para as civilizações asteca e maia. Refiro-me à fazenda Árvore Verde, nas terras de Macuco (Buerarema-BA), bem próximo à trilha ecológica da Serra do Jequitibá (Piteira), onde literalmente foi enterrado (plantado) o meu cordão umbilical. Um costume antigo que renasce hoje nas minhas reflexões.
Ainda menino, observei meu pai encaminhar a recuperação de pastos que estavam entregues ao mato, transformando-os em pastagens verdejantes para alimentar melhor os animais de tração, com o plantio de capim da melhor espécie, tremulando ao vento. Com a finalidade láctea, passou a alimentar igualmente um pequeno rebanho para suprimento local, cujas três matrizes eram ordenhadas com o devido asseio do úbere e com a utilização de água morna para não estressá-las, facilitando a posterior amamentação satisfatória das crias, ainda com a presença de orvalho na relva.
No quintal, além do aumento das espécies de árvores frutíferas (jambeiro, abieiro, cajá mirim, ingazeiro, jaqueira, laranja-lima, parreira, gravioleira etc.) que impulsionaram a polinização (Musubi) e passaram a produzir fartamente devido à adubação natural e ao bom trato, o canto do galo era novidade naquelas terras que ganharam vida nova, e que se conectou aos cantos das nove espécies de sabiás e de muitas outras belas aves, bem como o saíra-sete-cores, até mesmo algumas existentes predominantemente no Sul da Bahia (endemismo), tal qual o mamífero: mico-leão-de-cara-dourada, formando uma verdadeira sinfonia na área mais provida daquele bioma.
Com consideração e gratidão aos seus colaboradores, contando também com a espontaneidade e o entusiasmo de um auxiliar mirim (com 07 anos de idade) que, ao chegar da escola, obstinava para ajudar no plantio, ele construiu canteiros de mudas de cacau sem esperar aplausos, passando pela escolha das melhores amêndoas, até plantá-las com a devida conservação das grandes árvores com suas copas frondosas, capazes de lançar diariamente uma grande quantidade de água na atmosfera, umedecendo o ar em uma região ensolarada. Mantendo o devido sombreamento definitivo e adequado à cacauicultura que abriga, próximo dali (Itacaré/Ilhéus-BA), até 456 espécies arbóreas em um só hectare (caracterizando um recorde mundial segundo o Plano da Lavoura Cacaueira e o Jardim Botânico de Nova York), amparando o escoamento hídrico das microbacias que tiveram ainda as suas nascentes (cacimbas) tratadas. Servindo de corredores ecológicos com seus tapetes de folhagem antierosão que facilitam a infiltração da água, interligando importantes fragmentos de uma floresta tropical, dona de uma imensa biodiversidade.


Além das belas tonalidades das cores, dos sons, dos aromas, minha irmã (em férias escolares) e minha saudosa e afetuosa mãe, há exatamente um ano, trazia também à memória os sabores avigorados e produzidos naquele lugar paradisíaco (com exceção do sal de cozinha), a exemplo do melaço de cana que tudo adoça; o doce de groselha da Índia; o mangalô, a fava e o andu preparados com temperos e ervas aromáticas locais (tudo colhido a poucos passos da cozinha); o doce de calda e de corte de goiaba que provocam a sede saciada com água de talha; o jenipapo, a carambola e a banana passas (desidratadas) com canela; a canjica e o cuscuz feitos com milho verde e com a mais pura manteiga de garrafa; a paçoca de gergelim e a paçoca de banana da terra com cobertura de coco ralado; os licores com polpas de frutas selecionadas; a geleia feita com o puro mel (néctar) de cacau. Enfim, o legítimo e delicioso chocolate quente feito com amêndoas selecionadas e muito bem fermentadas e moídas artesanalmente no pilão, com o acréscimo do puro leite da hora, semelhante à receita pouco adocicada do suíço Henri Nestlé (século XIX). Muito além de uma simples commodity, considerada o "alimento dos deuses" (theobroma) há mais de 2000 anos, e que na década de 1970 atingiu mais de 80% da arrecadação baiana, chegando a empregar, embora sem o devido cumprimento das leis trabalhistas, 250 mil trabalhadores rurais em seu apogeu.
Ontem, dia da passagem da minha mãe para o plano espiritual (10/08/1926 a 27/05/2022), e dia Nacional da Mata Atlântica.

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